quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Ora yêyê Ô!


Testemunho

Fazem duas luas que aquela água gelada lavou meu orí, mãos e pés. Minha vergonha, meus sentidos e escorreu...

Fazem duas luas que beijei o chão quente do rei de Oyó e jurei em nome do tempo, de tempo e para o tempo, ser digna

Fazem duas luas que perdi os cabelos do medo, os fios frágeis de um caminho vacilante.

Fazem duas luas que me vestiram de branco para aprender a ser omon, filha dos astros, das folhas e dos lagos

E mergulhar fundo nas minhas próprias águas

Fazem duas luas do dia do arrebatamento, da conversão e de encontro com o céu

Dourado, reluzente, faceiro

Por mãos trabalhadoras, operárias incansáveis no cumprimento do dever. Dignas de pilãos, espadas, opaxorôs, cabaças encantadas, erukeres e palhas de proteção.

Colos espaçosos.

Fazem duas luas que ouvi a voz do trovão

Fazem duas luas que a ponta da flecha me apontou à Saketê

E mudei o nome, a vida

Encontrei a salvação, em nome não de um, mas daqueles que atravessaram mar e céu e no último suspiro de vida no ayê conduziram o axé até os meus dias

Fazem duas luas que por direito, aconchego e amor, me olho no espelho da manhã como filha do fogo, da vida, das estradas e matas fechadas

Fazem duas luas que, em terra de Oxogbô, Ijexá, Ilê Ifé, Abeokutá não sou intrusa

No meu centro, tenho a marca

Na pele, a cor das filhas de Yêyê.

***Aline, é jornalista, editora e hoje 15/10/2009 faz dois anos que renasceu pelas graças da dona das águas doces.

10 comentários:

Anônimo disse...

Muito bonito. Um texto com emoção de Muzenza!!

Anônimo disse...

( arrepiado e com lagrimas nos olhos) Tranferiste a tua emoção Aline, me fizeste refletir sobre o dia que não serei mas estranjeiro na terra de Ketu se é que virá o dia, mais prefiro continur olhando para as luas e esperando que aminha chegue mais se não chegar com certeza serei especialista na diplomacia do tempo, do dialogo com o vento e na beleza das luas.
parabens Aline.

Sócrates Santana disse...

Pois é...

Anônimo disse...

Lindo!!! E curioso fiquei para saber que mudança esta narrativa poética se refere. Ou de quem. Não creio seja ficção, ainda que poética, por demasia. Relato forte, de força vivida por experiência. Experiência própria, que só quem transcende. E sente. Assim pode escrever.

Guellwaar Adún disse...

Seguinte... todo espanto, arrepios, curiosidades e faróis dos espíritos foram acesos com esse testemunho altifalante e poético. Ora Yeyê, ô! 'nji te ni okan odara, dara... as linhas de Aline fluem como se fora o Paraguassu, São Francisco, Reno, Amazonas, Nilo e suas águas lavam não somente a alma de sua autora mas de todos aqueles que se deixam levar pela levebeleza exalada... lindo, simplesmente lindo... e depois o povo quer me convencer que só Jesus Cristo salva, fosse assim eu e tantos/as outros/as aqui não mais estariam...

MeL Adún disse...

Não entendi o "Reportagem"; pois é. Se der, explique camará...

Anônimo disse...

Belo e emocionante. palavras ricas e declarações fortes. seu testemunho nos teletransporta até o seu momento de mudança.
beijos / priscila

rOtinA poEtiCa disse...

pois é Zé... reportagem me deixou curioso....hum.

Anônimo disse...

Pois é Zé!!! reportagem me deixou curioso...

Guellwaar Adún disse...

-ERRATA-
(...)
e depois o povo quer me convencer que só Jesus Cristo salva, fosse assim eu e tantos/as outros/as aqui não mais estaríamos...